São Paulo terá de lidar com 'herança de devastação'
São
Paulo – O secretário municipal de Serviços de São Paulo, Simão Pedro (PT),
disse, em entrevista à RBA, que a iluminação pública e a limpeza urbana
foram deixadas sucateadas pelas gestões anteriores, de Gilberto Kassab (PSD) e
José Serra (PSDB), e que encontrou em sua pasta o resultado do que classifica
como uma política de desmonte. "Eles cumpriram o papel de enfraquecer o
Estado", afirma. Segundo o secretário, um exemplo é a coleta seletiva de
lixo, área na qual Serra "fez um grande desserviço à cidade de São
Paulo", com o corte de verbas.
Morador da zona leste, Simão Pedro é graduado em
Filosofia e tem mestrado em Sociologia Política pela PUC-SP. Um dos dois
deputados estaduais nomeados pelo prefeito Fernando Haddad, reelegeu-se em 2010
para seu terceiro mandato na Assembleia Legislativa pelo PT, com 118.453
votos.
No parlamento estadual, foi presidente da Comissão de
Serviços e Obras Públicas e líder do partido entre 2007 e 2008. Ao ser nomeado
presidia a comissão de Educação e Cultura da Assembleia.
Segundo Simão Pedro, a cidade hoje recicla apenas 1,5% de
todo o lixo produzido, e a meta da atual gestão é chegar a 10% daqui a quatro
anos. Ele propõe oferecer internet grátis na cidade a partir da periferia e
afirmou que a Copa do Mundo, que será realizada em 2014 no Brasil, é um dos
seus maiores desafios. "Até agora, nada foi feito da nossa pasta."
Confira a entrevista.
Quais são as principais dificuldades deste início de sua gestão. Como recebeu a
pasta do governo anterior?
Pegamos uma herança de devastação da máquina pública. Kassab
e Serra cumpriram o papel de enfraquecer o Estado. Por exemplo, a Ilume –
departamento da prefeitura que cuida da iluminação pública – está totalmente
desaparelhada, serviços todos terceirizados. Perdeu-se a capacidade de planejar
e fazer controle. A Amlurb (Autoridade Municipal de Limpeza Urbana), que cuida
da limpeza da cidade e gere contratos da ordem de R$ 150 milhões por mês,
também está desaparelhada, sucateada.
Uma de nossas tarefas é implantar uma autarquia prevista em
lei de 2002, o que não foi feito, fazê-la funcionar para que ela consiga
gerenciar, acompanhar e fiscalizar esses contratos de serviços de limpeza na
cidade. A mesma coisa com o serviço funerário, uma máquina de corrupção
descontrolada e serviços muito mal prestados. Ou os telecentros, que não se
renovaram. Temos uma tarefa imensa de melhorar esses serviços, tentar diminuir
os custos, dar mais eficiência aos contratos, aumentar nossa capacidade de
planejar, fiscalizar e gerenciar. Hoje São Paulo recicla 1,5% de todo o lixo.
Temos a meta de chegar a 10% daqui a quatro anos.
Há um cronograma para se chegar a esses 10%?
Na questão da reciclagem, dos 96 distritos da cidade só 74
têm coleta diferenciada. Uma vez por semana os caminhões das empresas de
limpeza recolhem o lixo que vai ser destinado às 20 centrais de reciclagem
instaladas na cidade. Somente 40% das residências de São Paulo são atendidas
por esse serviço – o que é muito pouco para uma cidade que produz tanto lixo.
Condomínios, shoppings, grandes geradores de resíduos
diariamente, pela lei devem contratar um serviço particular de recolhimento.
Depois que a taxa de limpeza foi extinta, a cidade de São Paulo recolhe lixo
gratuitamente do pequeno gerador (que produz até 200 litros de resíduos
por dia). Acima disso há mais de 50 empresas cadastradas na Amlurb para fazer a
coleta particular.
A nossa meta é levar a reciclagem para toda a cidade e
implementar mais 17 centrais de reciclagem, trabalhar os resíduos da construção
civil, já que muitos podem ser reciclados. É uma meta ousada, mas vamos
trabalhar muito para que a cidade tenha a sensação de que estamos diminuindo o
volume de lixo levado para os aterros e estamos ampliando o conteúdo reciclado.
Agora, claro que esse é um trabalho de longo prazo, que envolve educação
ambiental, conscientização e medidas que devemos aperfeiçoar e implementar aos
poucos.
A rede de articulação Coleta Seletiva do Butantã divulgou um estudo recente que
aponta que descartamos 93,6% de resíduos sólidos secos, que poderiam virar
material reciclável. Há algo referente a isso previsto na revisão do Plano
Municipal de Gestão de Resíduos Sólidos?
Vamos aproveitar este ano, quando vai acontecer a
Conferência Nacional de Meio Ambiente, para realizar um encontro municipal e o
tratamento dos resíduos sólidos será o tema principal. A conferência nacional
vai acontecer em outubro e queremos realizar a etapa municipal até agosto.
Vamos revisar o Plano para tratar esse tema com cuidado, em debate com a
sociedade paulistana, porque ela ainda não foi envolvida e não discutiu o
problema.
É bom ressaltar que o ex-prefeito José Serra fez um grande
desserviço à cidade de São Paulo. Ele exigiu um corte de cerca de R$ 1 bilhão
no contrato de concessão de 20 anos, que começou em 2004, postergou para o fim
do contrato a ampliação dos investimentos em coleta seletiva e implementação
das centrais de coleta.
Pela concessão feita pela ex-prefeita Marta Suplicy, as
concessionárias que fazem a coleta do lixo na cidade deveriam fazer
investimentos, principalmente em educação ambiental e implantação das centrais
de reciclagem. O que o Serra fez foi jogar para o final do contrato.
O ex-prefeito Kassab fez o pagamento no final do governo, o
chamado "equilíbrio econômico financeiro". Apoiamos o pagamento desse
equilíbrio, mas exigindo que os investimentos fossem trazidos para mais perto.
Por exemplo, a coleta aos domingos, ações de educação ambiental e implantação
dessas 17 centrais que serão feitas até 2016.
Em matéria de O Estado de S. Paulo no início de mês, o senhor comentou que a prefeitura vai oferecer
internet grátis em toda a cidade, mas a avenida Paulista aparece como
prioridade. Por que a Paulista, se há uma periferia imensa e carente desse
serviço?
Eu citei a Paulista como um exemplo de uma região da cidade
que tem um grande fluxo de pessoas, onde transitam muitos jovens. Tenho
gravado, não disse que a Paulista seria prioridade. Disse que começaríamos pela
periferia e, até junho, julho, queremos abrir o sinal em alguns pontos da
cidade para mostrar para a população que esse serviço é possível.
Eu falei da Cidade Tiradentes, da favela de Paraisópolis,
São Miguel Paulista, parques como o Anhangabaú e a Paulista. Até julho,
pretendemos apresentar ao prefeito um plano de como será aberto o sinal na
cidade como um todo, em que regiões e que modelos vamos utilizar. Pelas
conversas que tenho tido com alguns especialistas, eles dizem que São Paulo
precisa ter um modelo único, por exemplo, estender cabos de fibra ótica por
toda a cidade e a partir daí abrir uma antena. Podemos ter roteadores, vários
modelos na cidade.
A Paulista é uma região importante, onde transitam muitas
pessoas. Mas, por exemplo, na região central circulam 2 milhões de pessoas.
Evidente que, abrindo sinal na Praça da Sé, no Anhangabaú e na Praça da
República, vamos atingir uma parcela grande da população da cidade inteira.
Mas ainda não temos o plano desenhado. Citei esses bairros
como exemplos de regiões importantes, mas vamos estudar ainda e, até junho,
vamos apresentar um plano ao prefeito para trabalhar nos próximos quatro anos.
Também estamos preocupados evidentemente com a Copa. São Paulo vai receber seis
jogos, além da abertura.
Em termos de gestão, a perspectiva da Copa do Mundo atrapalha ou ajuda?
A Copa é uma oportunidade. Vamos receber muitos turistas,
que vão circular pela cidade, conhecer nossos monumentos, museus, parques.
Então, é evidente que queremos oferecer esses serviços aos cidadãos da cidade e
também aos cidadãos do mundo que vierem para usufruir desse período em São Paulo e possam se
comunicar. A Copa permite deixar um legado e, quem sabe, possamos conseguir
investimentos, recursos, patrocínios. Como a Copa é em 2014, a gente trabalha com
o tempo e isso exige um trabalho mais preciso do poder público, com cronograma
mais apertado.
Até agora, nada foi feito da nossa pasta. A antiga
administração fez muito pouco, criou um comitê e se preocupou muito com a
construção do estádio. O prefeito Fernando Haddad nomeou a vice-prefeita Nádia
Campeão para presidir o comitê (Comitê Integrado de Gestão Governamental
Especial para a Copa do Mundo de Futebol de 2014 – SPCopa) e ela está
trabalhando intensamente.
Queremos fazer uma Copa do Mundo sustentável e trabalhar a
reciclagem intensamente. Estou indo ao Rio (a entrevista foi gravada na terça-feira,
19) para uma reunião no BNDES – que tem uma linha de financiamento praticamente
a fundo perdido para investimentos na coleta seletiva e na modernização das
centrais. O Rio de Janeiro, por exemplo, recebeu um investimento do BNDES de R$
50 milhões, a prefeitura de Osasco recebeu R$ 10 milhões e a cidade de São
Paulo não foi atrás na gestão anterior. Agora espero receber uns R$ 70 milhões
para investir. Esse recurso está à disposição, por causa da Copa do Mundo.
Em relação à segurança pública, Alckmin e o Haddad fizeram parcerias pelas
quais o governo do estado mapearia áreas mal iluminadas, por meio da PM,
enquanto a prefeitura entraria com o serviço propriamente dito. Isso está
vigorando?
Na minha pasta, foi assinado um termo de cooperação entre a
Secretaria de Segurança Pública (SSP, estadual) e a Secretaria de Segurança
Urbana (municipal). A minha secretaria acabou entrando por conta da
iluminação pública, que tem a ver com segurança urbana. A SSP ficou de nos
oferecer o mapeamento das ocorrências de crimes de maior incidência (estupros,
assaltos, furtos) e vamos olhar com mais atenção esses locais para reforçar e
modernizar o sistema de iluminação nesses pontos.
Mas essa parceria já está vigorando na prática?
Não recebemos ainda os dados da Secretaria de Segurança
Pública. A Secretaria de Segurança Urbana fez um relatório do mapeamento que a
Guarda Metropolitana fez de pontos escuros, onde a iluminação é precária e tem
problemas de manutenção. Vamos lançar um programa chamado "Segurança e
Cidadania" para dar atenção máxima para esses locais e também reforçar e
modernizar a iluminação com prioridade para os lugares com grande frequência de
público – escolas, hospitais, estações de trem e metrô, terminais de
ônibus.
Vamos fazer uma nova licitação para o sistema de manutenção,
reforma e remodelação da iluminação pública, porque o contrato em vigor termina
em julho deste ano.
E a chamada transversalidade, como vai ajudar a sua secretaria?
Existem estudos sendo feitos conjuntamente com outras pastas?
Sim. Vou dar um exemplo: saiu um decreto instituindo um
grupo de trabalho entre secretarias de Planejamento, de Cultura e de Serviço
para pensarem juntas o oferecimento do serviço de wireless gratuito na cidade.
O governo criou também grupos de gestão integrada entre as 27 secretarias. A
minha secretaria é o grupo da gestão integrada de desenvolvimento territorial,
que engloba a Secretaria de Serviços, de Administração das Subprefeituras e de
Segurança Urbana. Por exemplo, com a Secretaria de Administração de Subprefeituras,
fazemos esse trabalho de diminuir os pontos de alagamentos constantes – já
mapeamos 132 pontos.
Estamos intensificando
juntos a limpeza de ramais e galerias. No Brás, estamos fazendo uma ação de
mudança de horário da coleta do lixo (leia aqui). O prefeito prefere trabalhar assim: não
tratar as secretarias como caixinhas isoladas, porque isso não dá eficiência,
nem efetividade. Essa integração melhora sensivelmente a qualidade da gestão
pública.
O senhor se reuniu com a Amlurb e com os catadores de material reciclável, que
sofreram muito na gestão Kassab. Como vai atender esses trabalhadores?
Primeiramente, a reunião foi histórica porque eles disseram
que nunca foram recebidos na secretaria. Queremos articular as secretarias de
Serviços, de Direitos Humanos, Assistência Social, Desenvolvimento Econômico e
Trabalho e de Meio Ambiente, e os catadores e suas organizações. Um comitê com
representantes dessas secretarias se reunirá periodicamente, para pensar de
forma integrada o trabalho da coleta seletiva.
Falamos da conferência municipal e do Plano de Gestão
Integrada de Resíduos que vamos rever, construir juntos, e a coleta seletiva
solidária, fazer aqui em São
Paulo como na política nacional – o governo Lula fez isso
bem, em todos os órgãos públicos e ministérios. Estamos fazendo um diagnóstico
e conhecendo cada uma das cooperativas e seus problemas.
Os catadores são importantes, e vamos tratá-los com todo o
respeito, como atores fundamentais, mais do que isso, agentes ambientais da
cidade, e temos que tratá-los assim, e apoiá-los nas reivindicações, capacitar
as cooperativas, buscar dar mais eficiência.
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